Iara Amina - A Origem

Plantado numa esquina da Kennedy, pertinho da antiga praça das Bolas, o Bar Atlântico dos portugueses Manuel e Manuela ganhara fama por causa das coxinhas, as desejadas coxinhas do Salu, até que um grande acontecimento fez tudo mudar.

Passava já das dez, o movimento fraco anotado na papeleta, uma dose de conhaque com mel pro Chico da Farmácia, Maurinho já tinha tomado o rabo de galo habitual e, por algum motivo desconhecido, os dois tinham se recolhido cedo.

No Balcão, apenas Helinho Bico Doce enfrentava a noite suarenta com uma porção de torresmo e uma cerveja quente, esperando o namorado.

Contrariado, seu Manolo desligou o rádio decidido a fechar a espelunca e em tom alto, falou voltando-se para o interior do Bar.

– Ó Salu! Larga essas panelas e vem me ajudar a descer a porta!

De braços abertos, contrariado, Helinho Bico Doce reclamou:

– Peraí ô seu Manolo, antes desce a saideira!!

− Deixa disso, oh pá! Tu estás a enrolar com essa cerveja faz mais de hora.

Respondeu irritado, o português e completou:

− Ó, Salu!! Venha logo homem de Deus!

Então, do interior do bar trajando uma toquinha branca de pasteleiro e um shortinho curto coberto por um aventalzinho engordurado amarrado com laço na cintura, Salustiano, todo empoado com farinha de trigo, surgiu irritado retrucando:

– Eichta!! Mas que pressa é essa Manolito, estou terminando uma massada pra manhã e....

Salustiano falava com irritação, mas logo mudou o tom ao se deparar com Helinho completando com meiguice:

– Hã!!! Oi Helinho, não sabia que você já tinha chegado.

− Oh, pá! Manolito é a boa bisca de tua mãe, pois agora vê se me ajuda a fechar a bodega e tu. – falou apontando para Helinho - Tu pegas esses torresmos e vá esperar teu namoradito lá fora.

Porém, quando o português e Salu se posicionaram junto a porta de ferro, uma mulher espevitada entrou no bar e, sem dar atenção aos dois, foi direto pro balcão cumprimentando Helinho que se preparava pra sair.

– Oi!

A mulher dirigiu o cumprimento ao Bico Doce falando de forma meiga quase se insinuando. Com um sorriso maroto, oferecido, Helinho respondeu ao cumprimento da recém chegada e satisfeito voltou a se acomodar no balcão.

 – Ooooiii!

Rápido, irritado e enciumado, Salustiano se interpôs entre a recém chegada e o namorado, resmungando:

– Ô queridinha, não viu que já fechamos!!

Fazendo dengo, a mulher tentou se desculpar.

− Ui!! Perdão, não notei o senhor.

– Senhor tá no céu queridinha! Além de loira é cega, não viu a gente fechando a porta?

Sem perder a calma, mas mudando o tom, a mulher reagiu irônica:

− É que tá escuro lá fora, não deu pra notar o cotonete de elefante.

Tentando conter o riso, Helinho se engasgou com a cerveja quente e foi reprendido por Salustiano que lhe aplicou um beliscão e ainda mais irritado tentou responder a desfeita falando com tom ameaçador:

– Escuta aqui ô espiga de milho oxigenada, se tu veio aqui pra...

Mas, a ameaça de Salu acabou sendo contida por Manolo que puxou o cozinheiro completando:

– Deixa disso Salu! Vá lá pra dentro cuidar das tuas coxinhas que eu aqui converso com a moçoila, vá, vá!

O português falou empurrando Salustiano de volta para a cozinha

− Pois então, agora diga-me quem é a senhorita?

Adotando novamente a postura insinuante, a mulher respondeu:

– Ui, pois não! Imagino que o senhor seja o proprietário desse estabelecimento? Muito prazer, eu sou Leocádia, mas o senhor pode me chamar de Leleca.

Sem ser notado por Manolo e desrespeitando a ordem do português, Salustiano manteve-se no salão ouvindo a conversa.

– Pois então, dona Leocádia...

Mas o português foi interrompido pela mulher que tocando delicadamente em seu braço, reagiu de forma sensual:

– Ui!! Leleca, por favor!

Ainda sem ter percebido que era observado por Salustiano, Manolo, um pouco incomodado, tentou retomar a conversa:

– Ora pois, que seja então, dona Leleca, o que estás a querer?

Apontando para Salustiano e Helinho que a tudo acompanhavam, Leleca insinuou:

– Tenho uma proposta pra fazer ao senhor. Mas só pro senhor!!

Alertado, Manolo voltou-se e surpreendendo Salustiano e Helinho ouvindo a conversa, irritado reclamou:

− Ai meu caraco! O que estão a fazer aqui seus gajos de merda! Passa os dois daqui, agora, vamos, saiam que eu vou fechar a porta!!

-0-

Na manhã seguinte, enquanto Manuela abria a porta de ferro deixando a luz de um sol de primavera invadir o interior do bar, varrendo o salão, Salu completou sua narrativa instigando a mulher do português:

– E foi assim Maneca, o Manuelito expulsou o Helinho e eu, e depois se trancou no bar com a loura oxigenada.

– Fila da puta! Então meu Manolito se enrabichou com essa tal Leleca?

Manuela falou com raiva ao mesmo tempo em que se dirigiu à cozinha ao fundo. Por sua vez, deixando a vassoura e tomando o lugar da patroa no balcão, Salustiano completou:

− Pois é, Maneca! Não ponho a mão no fogo por homem nenhum, nem pelo meu Helinho. O sem vergonha, é um cabritinho saltador, tá sempre pronto pra pular a cerca.

E enquanto Salu falava distraída, uma figura de gênero indefinível entrou no bar e, com voz grave, mas educadamente, interrompeu:

– Bom dia, eu queria falar com o dono do estabelecimento?

Salustiano estranhando a figura se engasgou gritando:

– Manuelita, tem um......uma....?? Ô dona Manuela! Tem gente querendo falar com a senhora.

Alertada, Manuela, retornou ao salão, reclamando:

– Ai caracas, Salu! Não precisa gritar que aqui já estou e...

Quando se deparou com a estranha presença, a bodegueira interrompeu a bronca. E, sorrindo, a figura de voz grave estendendo a mão para um cumprimento, se apresentou:

– Bom dia dona Manuela, meu nome é Rogéria, mas pode me chamar de Roger. A senhora é a proprietária desse bar?

– Ora pois, sou sim, eu e meu Manolito, somo donos dessa bodega. Mas o que a senhora...? Quero dizer, o senhor....? Ai caracas, mas o queres, oh pá!

– O negócio é o seguinte, eu tenho uma proposta pra senhora.

– Proposta? Como assim??

Apontando pra Salustiano que acompanhava a conversa, Rogéria completou.

– Será que tem um lugar pra gente conversar?

Ressabiada, a bodegueira tentou se esquivar:

− Ora pois, podes falar aqui mesmo, pois não tenho segredos com a Salu.

Então, sem se acanhar, Roger arrematou:

− Eu gostaria de saber se esse estabelecimento está à venda?

Surpresa com a pergunta, a bodegueira mudou de ideia e respondeu:

– Ora pois, sobre isso é melhor conversarmos lá nos fundos.

– Então, vamos lá!.

– Pois então, que seja! Ó Salu, aguenta aí que me vou aqui com seu Roger.

Intrigado, Salustiano pegou o pano de prato jogado por Manuela e se pôs a limpar o balcão enquanto Rogéria e Manuela foram pro interior do bar.

Quase em seguida a saída das duas seu Manolo entrou no bar e imediatamente, sem cumprimentar, perguntou para Salu:

– Ó Salu, onde está Manuela?

Enxugando um copo seco, de forma irônica, Salu respondeu:

– Bom dia, Manuelito! Noite longa a de ontem, não?

– Oh, pá! Já falei que Manuelito é a tua mãe, eu quero saber onde está Manuela, diga logo.

O português falava irritado ao mesmo tempo em que conferia o caixa do bar.

E, antes que Salu respondesse, Roger retornou ao salão e apenas cumprimentando com gestos, saiu sem falar com ninguém.

Quase em seguida, Manuela também retornou ao salão vindo da cozinha arrumando a saia e ajeitando os cabelos meio despenteados. Intrigado com a cena, Manolo perguntou ressabiado:

– Ai meu caraco!! Mas o que está a acontecer aqui?

Empertigado, Salustiano virou as costas e saiu para a cozinha respondendo incomodado:

− Francamente, Manolito, eu não sei, mas tô achando uma sem-vergonhice dos dois!

Olhando um pro outro, calados e sem entender a insinuação, o casal português acompanhou intrigado a saída de Salu. Até que Manolo perguntou.

– Ó, Manelita, o que foi isso que saiu daqui?

– Ora pois, uma mulher tu não viste?

– Mulher!? Mas quem é essa tal?

– Ai, Manolito, o nome da bisca é Roger.

– Roger!? O nome dessa mulher é Roger? Ai meu caraco! Mas o que tu estavas a fazer com essa tal Roger lá na cozinha?

Nervosa e chorosa Manuela retrucou:

− Queres saber, Manolito! Esse gajo estava a fazer comigo o mesmo que a bisca da lourinha, fez contigo aqui escondidinho ontem a noite.

Percebendo do que se tratava, tentando remediar a situação, o bodegueiro abraçou a mulher e respondeu:

– Ai meu, tesourinho! Sobre ontem, a senhorita Leocádia apenas me fez a proposta dum negócio.

Mas fugindo do abraço, irritada, Manuela não aceitou a explicação e ainda completou:

– Senhorita Leocádia é o caraco Manolito! O Salu ouviu muito bem tu chamar a bisca de Leleca, tu és um safado. Logo hoje, logo hoje Manolito!

– Ai caraca!! Aquele linguarudo do Salu. Ô meu tesourinho, não é nada do que tu pensas essa tal Leleca quer trazer um gajo hoje a noite para cantar aos clientes, fazer um show, depois eu te explico melhor. Ah, não fica assim meu pastelzinho de Belém.

O português falou carinhosamente abraçando a mulher que sem se deixar convencer retrucou.

– Ô Manolito, por que não me dissestes logo o que a tal Leleca queria?

– Ora pois, Manelita! Não deu tempo tesourinho. Ontem, quando cheguei, tu já estavas a dormir e só agora é que falamos.

– Ai Jesus! Mas não é que é mesmo! Pois então, tu ias me contar agoira?

– Lógico meu tesourinho, meu pastelzinho doce! Mas diga lá, o que esse gajo queria?

– Pois então, Manolito, a Roger me fez uma proposta, ele quer comprar a nossa bodega, o que tu achas?

– Ora pois, Manelita, não sei o que dizer, mas agora não quero estar a pensar nisto, pois esta noite nossa bodega vai estar cheia e tenho muito o que fazer.

– Entendi, está certo Manelito, depois conversamos sobre isso.

– Mas diga lá, meu pudinzinho, por que dissestes logo hoje, o que tem hoje?

– Poxa, Manolito! Não te lembras? Hoje vou a ter a tal da mamografia com o doutoire.

– Como é, mano o quê? Aqui, não estou a entender meu tesourinho, tu tens algum problema nas mãos?

Trazendo uma bandeja de coxinhas prontas, Salu retornara ao salão e ouvindo a conversa do casal, balançando a cabeça, interviu:

– Santa Ignorância! Ai, Manuelito, é mamografia, de mamas, está entendendo, mamas! - falou apalpando as próprias mamas - Pensas que isso é só pra ficar brincando de chupetinha, tem que cuidar também!

- Ai meu caraco!! Não falei contigo viu sua bisca linguaruda, vai-te e me esquece!

Manolo respondeu irritado fazendo gestos na direção de Salu que lhe deu as costas rebolando.

− Mas, é isso mesmo meu tesourinho, vais fazer essa tal manografia?

– Pois então! É isso, o doutoire vai examinar minhas tetas pra ver se tá tudo em ordem, compreendes?

– Pera lá, Manuelita, quer dizer que o gajo do doutoire vai apalpar esses meus papinhos de anjo? Mas, isso eu não admito e nem precisa, pois eu sei que está tudo bem.

– Ô Manolito, mas tu és uma besta mesmo. O exame de apalpação com as mãos eu já faço, o doutoire vai fazer o exame numa máquina que consegue ver mais de pertinho se está realmente tudo bem, tu compreendes?

– Ui, meu tesourinho, agora estou preocupado contigo.

E, satisfeita com a preocupação do marido, Manelita o abraçou carinhosamente e completou

− Ai meu queridinho, mas agora não te apoquentes, vamos ao trabalho, pois irei ao médico depois do almoço e temos muito o que fazer até a noite.


Então, essa história que Iara Amina escreve sobre sua origem, deve continuar, ou melhor, vale a pena publicar? Por favor, opinem.


Comentários

  1. Com certeza! Sigo no aguardo do desenrolar da história da Iara Amina....:)

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    1. Oi Nati, devo dizer que você me salvou, pois(pelo menos até agora) foi a única se mostrou favorável a continuação. Então, aguarde que assim que postar a continuação, aviso. Abração

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  2. Bora, Bira! Vamos lá pra parte 4!! Abração!!

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  3. Muito bom! Gostei. Anderson Brunholi

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    1. Opa, valeu Anderson, com certeza Iara Amina ficará satisfeita com essa teu comentário, abraços

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