ESQUERDA ANDA, DIREITA PARA!

Dia desses, eu e minha esposa fomos ao shopping e num dado momento subimos ao segundo pavimento por uma escada rolante. Nesse trajeto, somente nós dois na escada, em tom de brincadeira chamei a atenção dela  que me acompanhava à esquerda:

“esquerda anda, direita para!”

Bom, esse aviso que os paulistanos conhecem bem e levam a sério, normalmente e frequentemente é empregado no debate  político, pois associa a “esquerda anda” com “Esquerda progressista” e “direita para” com “Direita conservadora”. 

Apesar de que, muitas vezes, essa correlação se confirme, é importante entender que ela não é absoluta, ou seja, nem sempre a Esquerda é “progressista” e nem sempre a Direita é “conservadora”.

Digo isso porque, atualmente, uma das minhas preocupações como professor de História é combater os processos de polarização e demonização da “Política”.

Mas, antes de tudo, gostaria de esclarecer que sou historiador e não Cientista Político e, outra coisa, gosto tanto de mortadela como de coxinha, mas com moderação, pois minha gastrite crônica reclama o exagero. 

Então, minha abordagem é historiográfica e, na medida do possível, isenta e objetiva. Noutras palavras, analiso sem juízo de valor a origem do fenômeno e não tenho autoridade para uma abordagem conceitual e mais profunda. Nesse sentido sugiro um autor com essa autoridade, estou falado do filósofo italiano Norberto Bobbio (1909-2004) e sua obra “DIREITA E ESQUERDA: Razões e Significados de uma Distinção Política” publicado em 1994 pela Editora UNESP.

Assim, voltando à minha preocupação fundamental, quando explico a origem e o significado dos termos “Direita” e “Esquerda” aos meus alunos, o contexto é a Revolução Francesa(1789-1799), que em sua fase inicial, a da elaboração da Constituição, “os membros da Assembleia Nacional se dividiam em partidários do rei à direita do presidente e simpatizantes da revolução à sua esquerda.[1].

Ocorre que essa disposição física demarcou também a acomodação de Jacobinos e Girondinos na Assembleia Legislativa francesa durante o período da Monarquia Constitucional, esquerda e direita respectivamente.

Importante entender que tanto um quanto outro desses grupos se compunham de membros da burguesia, incluindo a “Alta” a “Média” e a “Baixa”, e seus líderes de um lado Robespierre e do Outro Brissot tinham posturas relativamente progressistas.

Importante também, destacar o caráter predominantemente burguês da própria Revolução. Portanto, podemos perceber claramente que a direita também “anda”, ou seja. assume em determinados contextos um viés progressista.

Por outro lado, um outro exemplo de que nem sempre a “Esquerda” é progressista e a “Direita”, conservadora. pode ser constatado com acontecimentos mais recentes cujo protagonista foi o etílico personagem Boris Yeltsin que, em 1991, liderou o processo de dissolução da antiga União da Repúblicas Socialistas Soviéticas e, aos trancos e barrancos, implantou na Rússia a economia de mercado. 

Como podemos ver, nesse caso, a “Direita” assumiu um caráter progressista enfrentando uma Esquerda reacionária e conservadora.

Recentemente li uma matéria abordando o fenômeno político atual de polarização estimulando o “antagonismo" Esquerda versus Direita, em outras palavras, o confronto ou o conflito para ascensão ao poder. 

Essa estratégia propalada por um sujeito chamado Steve Bannon[2], não pode e não deve ser associada ao campo da “Política” e sim ao da primitiva disputa tribal, uma guerra onde o opositor deixa de ser um adversário de ideias a ser enfrentado com o diálogo e passa a ser visto como um inimigo que deve ser destruído.

Devemos entender que, a "Política" é movida pelo “agonismo”, conceito definido pela Cientista Política Chantal Mouffe da seguinte forma: 

“Enquanto que o antagonismo é uma relação nós/eles na qual as duas partes são inimigas que não partilham qualquer referencial comum, o agonismo é uma relação nós/eles entre partes em conflito que, apesar de admitirem que não existe qualquer solução racional para o seu conflito, reconhecem a legitimidade do seu oponente. São "adversários", não "inimigos”.[3]

Então, concluindo, tanto Esquerda como Direita, progressistas e conservadores e vice e versa, são legítimas visões de mundo que, racionalmente, devem ser respeitadas, assim como o espaço onde elas se expõem, a "Política", deve ser entendido como o único capaz de construir um caminho para o progresso e a solução dos problemas.

[1] ESQUERDA E DIREITA (POLÍTICA). In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2021. Disponível em: 
<https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Esquerda_e_direita_
(pol%C3%ADtica)&oldid=62424520. Acesso em: 15/12 2021.

[2] Sobre o maquiavélico Steve Bannon sugiro dois documentários, o primeiro bem específico “The Brink” , cujo link do trailer é - https://youtu.be/FjfUPLEKZtI; O segundo, mais geral, que apresenta um “modus operandi” dele, “Privacidade Haqueada” disponível na Netflix, sgue o link do trailer - https://youtu.be/wjXYCrxRWqc.

[3] CHANTAL MOUFFE. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2019. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Chantal_Mouffe&oldid=54027530>. Acesso em: 15.dez. 2021.

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